Trabalhar para viver ou viver para trabalhar?
Tira um curso, encontra uma boa empresa, trabalha com esforço e dedicação e vais subir na sua hierarquia, se possível mantêm-te lá até te reformares. Para quem como eu nasceu na década de 80 (ou menos) este era um conselho de muito valor oferecido a custo zero pelos nossos pais. O Santo Graal era entrar numa empresa o mais estável e sólida possível, uma empresa que conseguisse assegurar aos seus colaboradores uma segurança que muitas das pequenas empresas não conseguiam. Após entrar, basicamente tudo se resumia a trabalhar muito, não levantar muitas ondas, e esperar as tão aguardadas promoções. O sucesso na vida, e consequentemente a nossa felicidade era medido pelo trabalho que se tinha e pela progressão que se alcançara. Hoje em pleno século XXI, arrisco dizer que as coisas mudaram radicalmente.
Decerto já repararam que as pessoas mais jovens ambicionam um estilo de vida bem diferente dos seus pais. No exemplo que te dei acima, o emprego para a vida permite que as pessoas tenham um estilo de vida mais consumista, ou seja, existe um salário que entra todos os meses e que permite que se tenha dinheiro para uma casa ou um carro (bem como para todo um conjunto de coisas). Quer se queira quer não, quem se considera seguro no seu trabalho acaba por adaptar o seu estilo de vida ao seu salário, ativando toda uma veia consumista bem presente em vários milhões de pessoas. Acredito que as coisas estão a mudar, as pessoas mais novas não ambicionam a casa grande ou o carro brilhante e bonito. Diria que os objetos mais desejados pelas novas gerações são um excelente smartphone ou um excelente laptop ou tablet que lhes permita estar ligados ao mundo. A felicidade já não se mede pelos bens materiais, mas sim pelas experiências que se vivem. O automóvel passou a ser encarado como um custo e como um bem não essencial. Na geração do uber, das trotinetes elétricas, do car sharing fará sentido continuarmos a ter este gasto enorme nas nossas vidas? Para além de termos que pagá-lo, existe todo um conjunto de gastos como manutenção, seguro e selo. Se fizeres contas ao tempo que passas a conduzir, se calhar em 24h conduzes 1h30 ou 2h, o resto do tempo tens o teu automóvel parado. É exatamente por isso que novas gerações preferem não ter um gasto desta magnitude nas suas vidas. O mesmo acontece para as casas, estas devem ser práticas e mais pequenas. Do que adianta ter uma casa enorme se depois vais acabar por estar 99% do tempo nas mesmas divisões? A ostentação de luxo foi substituída pela praticabilidade.
A própria carreira mudou, e penso que no futuro se vai alterar ainda mais. Estudar durante anos para obter uma competência em determinada área e praticá-la durante 40 anos já não é a tendência. A tendência é ganhar competências em várias áreas, e ir experimentando até se encontrar aquilo que nos apaixona. Passamos demasiadas horas da nossa vida a trabalhar para nos darmos ao luxo de fazermos algo que não gostamos. Isso conduz a infelicidade, e infelicidade conduz a um aumento do consumo em coisas que não precisamos (para nos sentirmos um pouco melhor). O foco agora é aprender continuamente, estudar durante toda a vida, procurar novas experiências. A própria reforma acredito que vá ser bem diferente, onde antes se aproveitava a reforma para basicamente "não fazer nada", diria que no futuro a tendência será continuarmos a trabalhar naquilo que nos deixa felizes.
Acredito que neste momento as pessoas podem ambicionar a viver de acordo com o seguinte ciclo:
1. Estudar sobre um tema/área que nos apaixone;
2. Conseguir emprego nessa área e entregar valor;
3. Trabalhar nessa área enquanto isso te mantiver feliz e realizado;
4. Parar e descansar. Refletir sobre a experiência;
5. Identificar novos conhecimentos ou temas que queres perseguir e começar novamente do ponto 1.
Ora, o ponto 1 e o ponto 2, é onde todos nós, bem ou mal vamos chegar sem grande problema. O segredo está nos restantes pontos. Ter a capacidade de sair de um emprego que não te deixa feliz é um passo de grande coragem, mas é um passo que apenas tu podes tomar. Diria que se chegas ao final de cada domingo, com uma sensação de mau estar e com muito pouca vontade de trabalhar no dia seguinte, então está na hora de experimentares algo novo.
Relativamente ao ponto 4, e para que possas desfrutar em pleno deste, necessitas de ter uma mentalidade minimalista e pouco consumista, ou seja, durante o período em que te encontras a entregar valor (ponto 3), deves poupar uma boa quantia de dinheiro, que te permita viver o ponto 4 em pleno e com tranquilidade. É aqui que deves parar, recarregar energias, ganhar fôlego e pensar no próximo passo que queres dar. Normalmente estamos tão absorvidos no nosso dia-a-dia que acabamos por não ter tempo para pensar se o rumo que estamos a tomar é ou não o mais correto. E convém dizer que 20 e poucos dias de férias por ano é manifestamente pouco para poderes descansar.
As novas gerações também querem flexibilidade, quem disse que o correto é trabalhar das 9h às 18h? Se sou ultra produtivo no período das 7h às 9h porque não o posso fazer e sair por volta das 16h? O mesmo vale para pessoas que são muito produtivas durante a noite. Logicamente que nem todos os tipos de trabalho permitem uma flexibilidade destas, mas diria que uma grande percentagem deles, que envolvem conhecimento e criatividade têm todas as possibilidades para o fazer.
Finalmente, aproveita a pausa referida no ponto 4 para começares a realizar o ponto 5, e consequentemente voltares ao 1. Este ciclo vai dar-te conhecimento sobre um grande conjunto de temas, o que te vai transformar num profissional mais completo e espero eu, mais realizado e concretizado. Os custos com educação vão ser mais elevados, mas também mais espaçados no tempo. Isso é algo que também já está a mudar. Os cursos universitários e MBA´s de 50k€ provavelmente vão perder cada vez mais relevância. São valores incrivelmente altos a pagar por educação num tão curto espaço de tempo. Não será preferível investir os 50k€ ao longo da vida em cursos diferentes e que se adaptem mais ao que pretendes em determinada fase da tua vida? Ao perseguires novos interesses, acredito também que vais conseguir viver uma vida mais gratificante e com mais felicidade.
E tu? Com o que te identificas? Trabalhar para viver ou viver para trabalhar?